Artigos | Postado em: 14 outubro, 2024

A Remuneração do Corretor no Caso de Arrependimento das Partes Contratantes

A questão da remuneração do corretor de imóveis em situações de arrependimento ou desistência das partes contratantes é frequentemente debatida nos tribunais. Embora a atividade de corretagem seja regida por normas específicas do Código Civil Brasileiro, é necessário se distinguirem os conceitos de arrependimento e desistência, para se entender em quais situações a comissão do corretor é devida. 

O artigo 725 do Código Civil estabelece que a comissão de corretagem é devida quando o negócio se concretiza pela intermediação do corretor, ou ainda que não se efetive devido ao arrependimento das partes. 

Primeiramente, é importante entender que o arrependimento se refere à situação em que, após a realização do negócio e o aceite das partes, uma delas ou ambas decidem desfazer o contrato por vontade própria. Já a desistência ocorre antes da formalização do contrato, sendo fundamental compreender esta distinção, pois, dependendo da fase em que acontecer, poderá ficar alterado o direito do corretor à comissão. 

Assim, nos casos de arrependimento, que ocorrem após a assinatura de um contrato preliminar ou definitivo, ou mesmo após o ajuste verbal, ou comprovadamente por outros meios, a regra geral é a de que o corretor faz jus à sua remuneração. O Superior Tribunal de Justiça tem reafirmado que o corretor tem direito à comissão desde que o negócio tenha sido formalmente ajustado entre as partes, independentemente do arrependimento posterior.  

Portanto, o arrependimento de uma das partes ou ambas, após a realização, verbal ou escrita, da promessa de compra e venda, não afasta o direito do corretor à comissão, desde que a intermediação tenha sido eficiente. 

Já nos casos de desistência, os quais ocorrem antes da conclusão do negócio, a circunstância é outra. Se as partes desistirem de prosseguir com a negociação antes de o contrato ser firmado, a comissão não é devida.  

Porém, caso haja disposição contratual específica estabelecendo alguma condição para o pagamento da comissão, o que ficou estabelecido entre as partes prevalecerá, ainda que contrarie o disposto no art. 725 do Código Civil. 

Ou seja, a comissão é direito disponível do corretor de imóveis, e seu recebimento pode ser condicionado a algum fato ou evento futuro, o que prestigia a livre vontade das partes e a autonomia privada. 

Exemplo disto é o julgado abaixo, do Superior Tribunal de Justiça: 

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA C/C DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CLÁUSULA CONTRATUAL. PRAZO PARA OFERECER CONTESTAÇÃO E PROPOR RECONVENÇÃO. TERMO INICIAL. DATA DA AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO INFRUTÍFERA. CONTAGEM. EXCLUSÃO DO DIA DO COMEÇO E INCLUSÃO DO DIA DO VENCIMENTO. INTEMPESTIVIDADE. NÃO CONFIGURAÇÃO. CONTRATO DE CORRETAGEM. INTERMEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA. PAGAMENTO DE COMISSÃO. RESULTADO ÚTIL. REGISTRO IMOBILIÁRIO. DESNECESSIDADE, EM REGRA. PACTUAÇÃO DE CONDIÇÃO SUSPENSIVA. POSSIBILIDADE. DIREITO DISPONÍVEL. AUTONOMIA DA VONTADE E LIBERDADE DE CONTRATAR. PREVALÊNICA NO DIREITO PRIVADO. 

  1. Ação de cobrança c/c declaratória de nulidade de cláusula contratual, ajuizada em 2/10/2018, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 5/8/2021 e concluso ao gabinete em 6/5/2022.
  2. O propósito recursal é definir se (I) a contestação e a reconvenção foram protocoladas de forma tempestiva; e, (II) em contrato de corretagem de assessoria técnico-imobiliária, as partes podem condicionar o pagamento da respectiva comissão ao registro imobiliário, a despeito do art. 725 do CC/2002.
  3. Havendo audiência de conciliação infrutífera, a data de sua realização será o dia do começo (termo inicial) do prazo de 15 dias úteis para oferecer contestação e propor reconvenção, excluindo-se, na contagem, o dia do começo e incluindo o dia do vencimento.

Inteligência dos arts. 335, I, 343 e 224 do CPC/2015. 

  1. Segundo a jurisprudência desta Corte, será devida a comissão de corretagem por intermediação imobiliária se o corretor alcançar o resultado útil do negócio, ou seja, se os trabalhos de aproximação por ele realizados resultarem, efetivamente, no consenso das partes quanto aos elementos essenciais do negócio, ainda que o resultado final não se efetive por arrependimento imotivado das partes (art. 725 do CC/2002).
  2. O registro da escritura pública de compra e venda não é, em regra, necessário para que se alcance o resultado útil, para fins de obrigação do pagamento de comissão de corretagem em negócios imobiliários.
  3. Não obstante, a presente hipótese não consiste em interpretar se determinado conjunto de atos praticado pelo corretor é ou não suficiente, à luz das obrigações contratuais assumidas, para se enquadrar no conceito de resultado útil. Trata-se, no particular, da análise da implementação ou não das condições suspensivas expressamente pactuadas pelas partes no contrato de corretagem, na forma dos arts. 121 e 125 do CC/2002.
  4. No direito civil brasileiro, predomina a autonomia privada, de modo que se confere, em regra, total liberdade negocial aos sujeitos da relação obrigacional. Em contratos típicos, além das regras gerais, as disposições legais específicas devem ser observadas, sob pena de nulidade, salvo quando se tratar de direito disponível.
  5. O direito do corretor de ser remunerado pela mediação realizada (art. 725 do CC/2002) é um direito disponível. Portanto, em um determinado contrato de corretagem, as partes podem optar por condicionar o pagamento da comissão a evento futuro e incerto – como à aprovação de determinado órgão, ou à efetivação de registro imobiliário -, respeitados os limites legais, notadamente, os arts. 121 a 130 do CC/2002.
  6. Hipótese em que (I) a audiência de conciliação ocorreu no dia 6/11/2018, ficando esse dia, portanto, excluído, iniciando-se a efetiva contagem a partir do dia 7/11/2018, de modo que foi tempestivo o protocolo da contestação e da reconvenção no dia 3/12/2018, último dia do prazo, considerando os 4 dias em que houve a suspensão do expediente forense e dos prazos processuais; e, (II) considerando que não se implementou a condição suspensiva (registro imobiliário) livre e expressamente pactuada pelas partes no contrato de corretagem, a recorrente não adquiriu o direito à remuneração nele previsto, nos termos do art. 125 do CC/2002.
  7. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido.

(REsp n. 2.000.978/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 21/3/2023, DJe de 23/3/2023.) 

No caso acima, o contrato estabeleceu que a comissão somente seria devida após o registro da escritura de compra e venda. Em não tendo havido o registro, ainda que tenha se concretizado o negócio com pagamento do preço, decidiu-se que não é devida a comissão, pois deve prevalecer o que ficou livremente pactuado entre as partes, ainda que contrarie o art. 725 do CPC, por se tratar de direito disponível, como se disse. 

Ainda, importante ressaltar, que o corretor não terá direito à comissão quando ele agir com negligência, omissão ou má-fé. Se o corretor falhar em seu dever de diligência, omitir informações relevantes sobre o imóvel ou a negociação, ou se sua conduta for a causa do desfazimento do negócio, ele poderá perder o direito à remuneração.  

Assim, o princípio da boa-fé objetiva deve reger todos os contratos, de forma que o corretor atue de forma transparente e leal em todo o processo de intermediação. 

O STJ já se pronunciou diversas vezes no sentido de que, havendo a intermediação bem-sucedida e a celebração do contrato, o arrependimento posterior das partes não impede o corretor de receber a comissão. Isso se aplica tanto ao arrependimento de uma das partes quanto à situação em que ambas decidem desfazer o negócio por acordo mútuo. Tal entendimento já não se aplica no caso de desistência, que ocorre antes da celebração do negócio. 

No entanto, quando o contrato de corretagem prevê o pagamento da comissão a depender de algum evento futuro, é a disposição contratual que deverá prevalecer. 

Por fim, a redação precisa do contrato de corretagem ou a definição clara entre as partes são essenciais para evitar disputas e litígios desnecessários. Portanto, em qualquer ajuste faz-se necessário definir com clareza as condições em que a comissão será paga, incluindo-se a diferenciação entre as hipóteses de desistência e arrependimento, e prever em quais circunstâncias o corretor terá direito à remuneração, o que proporciona maior segurança jurídica para todas as partes envolvidas.