Artigos | Postado em: 18 setembro, 2024

A Não Incidência do ITBI na Integralização de Imóveis ao Capital Social de Pessoa Jurídica

Conforme visto anteriormente neste blog, no artigo “Holding e S.A.: Vantagens e Desafios na Gestão e Sucessão Patrimonial”, a constituição de uma holding é uma estratégia frequentemente utilizada para proteção patrimonial.  

Por meio desse tipo de estrutura societária, é possível organizar e gerir bens, como imóveis, de forma mais eficiente e segura, separando o patrimônio pessoal dos sócios das atividades empresariais.  

Além da proteção jurídica, uma das grandes vantagens da criação de uma holding é a possibilidade de otimizar a carga tributária, especialmente em relação ao ITBI – Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis. 

Ao integralizar bens imóveis no capital social de uma empresa, sendo ela uma holding ou não, em regra, não há incidência de ITBI, desde que a atividade preponderante não seja a compra, venda ou locação de imóveis. Essa imunidade está prevista no artigo 156, § 2º, inciso I, da Constituição Federal, que isenta do ITBI a transferência de imóveis para pessoa jurídica com a finalidade de integralização de capital social. 

É o que diz a jurisprudência neste sentido: 

RECURSO DE APELAÇÃO E REMESSA NECESSÁRIA DA SENTENÇA – AÇÃO DECLARATÓRIA – IMUNIDADE TRIBUTÁRIA (ITBI) – ART. 156, § 2º, INCISO I, DA CF/88 – INCORPORAÇÃO DE BEM IMÓVEL AO PATRIMÔNIO DA PESSOA JURÍDICA EM REALIZAÇÃO DE CAPITAL – PREPONDERÂNCIA DA ATIVIDADE DE VENDA OU LOCAÇÃO DE PROPRIEDADE IMOBILIÁRIA OU A CESSÃO DE DIREITOS RELATIVOS À SUA AQUISIÇÃO NÃO CONSTATADA – POSSIBILIDADE DO RECONHECIMENTO DE IMUNIDADE TRIBUTÁRIA – VALOR DO IMÓVEL SUPERIOR AO CAPITAL SOCIAL INTEGRALIZADO – IMUNIDADE APENAS QUANTO AO LIMITE DO CAPITAL SOCIAL – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO – SENTENÇA RETIFICADA EM PARTE. De acordo com o artigo 156, § 2º, inciso I, da Constituição Federal, não deve incide imposto de transmissão de bem imóvel, para o fim de integralização do capital de sociedade empresarial, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil. Se a atividade preponderante da pessoa jurídica não for de venda ou locação de propriedade imobiliária ou a cessão de direitos relativos à sua aquisição, deve ser aplicada a imunidade na transmissão de bem imóvel, para o fim de integralização do capital social. Conforme entendimento jurisprudencial, quando o valor venal do imóvel é superior ao da integralização do capital social da pessoa jurídica com o bem imóvel, deve ser recolhido o ITBI sobre a diferença. 

(TJ-MT 10000868220208110094 MT, Relator: MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, Data de Julgamento: 16/08/2022, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 23/08/2022) 

E também: 

APELAÇÃO CÍVEL – MANDADO DE SEGURANÇA – DIREITO TRIBUTÁRIO – IMPOSTO SOBRE TRANSMISSÃO DE BENS IMÓVEIS POR ATO ONEROSO “INTER VIVOS” – IMUNIDADE TRIBUTÁRIA INCIDENTE SOBRE A TRANSMISSÃO DE BENS INCORPORADOS AO PATRIMÔNIO DE PESSOA JURÍDICA EM AUMENTO DE CAPITAL – INCORPORAÇÃO DECORRENTE DE OPERAÇÃO DE CISÃO PARCIAL – ATIVIDADE PREPONDERENTE DA EMPRESA – HOLDING E CONTROLADORA PRESTADORA DE SERVIÇOS HOSPITALARES – DEMONSTRAÇÃO – SEGURANÇA CONCEDIDA 1. Nos termos do art. 156, inciso II, § 2º da Constituição Federal, dos artigos 36 e 37 do CTN e da Lei Municipal n. 1.909/2005, o ITBI não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil. 2. Conforme art. 37, § 1º, do CTN, considera-se caracterizada a atividade preponderante quando mais de 50% (cinquenta por cento) da receita operacional da pessoa jurídica adquirente, nos 2 (dois) anos anteriores e nos 2 (dois) anos subsequentes à aquisição, decorrer de transações de venda ou locação de propriedade imobiliária ou de cessão de direitos relativos à sua aquisição. 3. O critério da atividade preponderante não se verifica, exclusivamente, pela leitura do objeto descrito no contrato ou estatuto social ou das atividades informadas no CNPJ, mas também pela análise da receita operacional da sociedade, por meio de seus documentos contábeis, notadamente nos casos em que possui diversos objetos sociais. 4. Quando se tratar de holding mista, a análise de receita operacional demandará exame não apenas das atividades diretamente praticadas pela sociedade, mas também as indiretas, por meio da participação em controladas. 5. Existência de elementos a demonstrar que tanto a atividade direta da holding quanto a de sua controlada não são preponderantemente imobiliárias, o que respalda o afastamento exigibilidade do ITBI, em razão da norma imunizante. 6. Recurso provido. (TJ-MG – AC: 50051351820228130027, Relator: Des.(a) Áurea Brasil, Data de Julgamento: 11/05/2023, 5ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 12/05/2023) 

Segundo o disposto nos artigos 156, §2º, I da CF e 36, I, do CTN, o referido imposto não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, pois a integralização se destina ao pagamento de capital nela subscrito. Veja: 

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: 

  • 2º, I – não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil;

CTN – Lei nº 5.172 de 25 de Outubro de 1966 

“Art. 36. Ressalvado o disposto no artigo seguinte, o imposto não incide sobre a transmissão dos bens ou direitos referidos no artigo anterior: 

I – quando efetuada para sua incorporação ao patrimônio de pessoa jurídica em pagamento de capital nela subscrito;” 

Esta imunidade tem por objetivo principal incentivar a capitalização e o crescimento das empresas, permitindo que sócios aportem bens imóveis sem que a operação seja onerada pelo imposto de transmissão. 

Além disso, visa evitar a dupla tributação sobre operações que, em essência, não representam uma transferência de riqueza entre pessoas jurídicas distintas, mas uma reorganização interna do patrimônio.  

Assim, a norma constitucional busca proteger a capacidade de capitalização das empresas, permitindo que ativos imobiliários sejam integralizados ao capital social sem o ônus do ITBI, desde que atendidas as condições estabelecidas, especialmente a de que a atividade preponderante da empresa não seja imobiliária. 

Um aspecto relevante dessa discussão é a análise do conceito de atividade preponderante, previsto no artigo 37, §1º do Código Tributário Nacional (CTN).  

Para verificar se uma empresa se enquadra na hipótese de imunidade, é fundamental examinar suas atividades nos dois anos anteriores e posteriores à aquisição do imóvel. Caso mais de 50% da receita operacional da empresa, nesse período, provenha da compra, venda ou locação de imóveis, a imunidade não se aplica, sendo o ITBI devido sobre a transmissão dos bens. 

Outro ponto a ser considerado é a proporcionalidade entre o valor atual de mercado dos imóveis integralizados e o capital social subscrito. A jurisprudência tem se posicionado no sentido de que, se o valor do imóvel transferido for superior ao montante integralizado como capital social, o ITBI incidirá sobre a diferença, isto é, sobre o excedente.  

Assim, o benefício da imunidade tributária se limita ao valor correspondente à integralização do capital, apesar da legislação não fazer qualquer menção ou ressalva nesse sentido, o que ensejará ainda muitos debates e decisões conflitantes sobre o tema. 

Por fim, é importante destacar que, embora a imunidade do ITBI na integralização de imóveis ao capital social seja um direito assegurado pela Constituição e reforçado pelo CTN, sua aplicação prática exige a comprovação detalhada da atividade da empresa e a análise de documentos contábeis 

Esse controle visa evitar fraudes e o uso indevido do benefício fiscal, garantindo que o incentivo atenda apenas às empresas que efetivamente utilizam os imóveis como parte de uma estratégia empresarial de capitalização, e não de operações imobiliárias comerciais. 

Isso reforça a importância de realizar uma análise detalhada e personalizada em cada caso, conduzida por profissionais qualificados, para determinar a melhor estratégia jurídica na transferência dos imóveis para a pessoa jurídica.