Artigos | Postado em: 9 junho, 2025

A exigência de prova concreta para a desconsideração da PJ – AgInt no AREsp 2.139.331/SP

Como já foi esclarecido, o Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica é uma ferramenta prevista no Código de Processo Civil que permite a responsabilização direta dos sócios ou administradores de uma empresa, ignorando a separação jurídica que normalmente existe entre a pessoa jurídica (empresa) e as pessoas físicas que a compõem. 

Ocorre que em busca de se impedir a “banalização” do uso da ferramenta judicial, a recente evolução doutrinária e jurisprudencial tem reafirmado a necessidade de prova concreta e específica de desvio de finalidade ou confusão patrimonial para justificar a desconsideração da personalidade jurídica. 

Anteriormente, o Superior Tribunal de Justiça já havia proferido decisão no AgInt no AREsp 1.679.434/SP, reafirmando que a desconsideração exige a comprovação de abuso da personalidade jurídica, não sendo suficiente a mera inexistência de bens ou o encerramento irregular da empresa. 

Agora, em recente decisão, a 4ª Turma do STJ julgou o AgInt no AREsp 2.139.331/SP entendeu que “a irregularidade no encerramento das atividades ou dissolução da sociedade não é causa suficiente para a desconsideração da personalidade jurídica, devendo ser demonstrada a ocorrência de caso extremo, como a utilização da pessoa jurídica para fins fraudulentos (desvio de finalidade institucional ou confusão patrimonial)”. 

Ou seja, não basta pedido genérico fundamentado no art. 50 do CC, sendo necessário que haja prova concreta do desvio de finalidade, que se caracteriza pela utilização da empresa para práticas contrárias à lei ou para atender a interesses pessoais dos sócios, e, não os objetivos sociais da empresa, ou da confusão patrimonial, que consiste na mistura dos patrimônios pessoal e empresarial, como, por exemplo, o uso de bens da empresa para fins pessoais dos sócios, sem distinção clara entre o que pertence à empresa e o que pertence aos sócios. 

Existe o requisito objetivo (insuficiência patrimonial do devedor), como também o requisito subjetivo. Este se refere ao desvio da finalidade ou confusão patrimonial por meio de fraude ou de abuso de direito. Sendo assim, é necessária a presença dos dois para que seja instaurado o incidente.  

O próprio art. 134, §4º do CPC, prevê que o requerimento de incidente deve demonstrar o preenchimento dos pressupostos legais específicos para desconsideração da personalidade jurídica. 

Veja abaixo o dispositivo: 

Art. 134. O incidente de desconsideração é cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial. 

  • 4º O requerimento deve demonstrar o preenchimento dos pressupostos legais específicos para desconsideração da personalidade jurídica.

E em alguns casos, a jurisprudência admite a rejeição liminar do incidente: 

SOCIEDADE – Desconsideração da personalidade jurídica – Rejeição liminar do pedido de instauração de incidente para despersonalização da pessoa jurídica e para a inclusão dos sócios da empresa-executada no polo passivo da execução – Admissibilidade – A instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica depende de indícios concretos de ocorrência de fraude – O encerramento irregular da sociedade, por si só, não constitui fundamentação suficiente ao deferimento da instauração do incidente – É preciso haver elementos objetivos que justifiquem a citação dos terceiros e, na sua ausência, é admissível a rejeição liminar do incidente – Sem indícios concretos não se justifica o chamamento de terceiros para discutir incidentalmente o tema – Decisão mantida – Recurso desprovido. (TJ-SP – AI: 21188591420188260000 SP 2118859-14.2018.8.26.0000, Relator: Álvaro Torres Júnior, Data de Julgamento: 17/09/2018, 20ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 20/09/2018) 

Portanto, a 4ª Turma do STJ, no julgamento do AgInt no AREsp 2.139.331/SP, reforça a segurança jurídica do empresário ao entender que a responsabilidade patrimonial dos sócios só pode ser estendida quando cabalmente demonstrada a utilização indevida da pessoa jurídica.  

Com isso, evita-se que a desconsideração, que é uma medida extrema e deve ser utilizada como exceção, não se torne regra e que a autonomia da vontade e da estrutura societária seja desfigurada por decisões baseadas em meras presunções ou conveniências processuais.